O envio de armas avançadas americanas à Ucrânia —que incluem um sistema de foguetes de lançamentos múltiplos— pode ser o limite para o governo Putin, que acusou os Estados Unidos de “jogar lenha na fogueira” e disse que a nova ajuda militar “aumenta o risco” de confronto militar entre Rússia e Estados Unidos.
O presidente norte-americano Joe Biden confirmou que vai enviar à Ucrânia os sistemas Himars (Sistema de Foguetes de Artilharia de Alta Mobilidade, na sigla inglesa), mais especificamente o M142, que permitem lançamentos múltiplos de foguetes a 80 quilômetros de distância.
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“Nós acreditamos que os Estados Unidos jogam lenha na fogueira de maneira deliberada (…) As entregas [de armas] não encorajam as autoridades ucranianas a retomar as negociações de paz”, disse o porta-voz da presidência russa, Dmitri Peskov, enquanto a Rússia amplia o controle sobre a região separatista de Lugansk.
As negociações de paz entre Kiev e Moscou estão paralisadas desde o fim de março, quando a Rússia anunciou a retirada de suas tropas dos arredores de Kiev e informou que se concentraria na região do Donbass, leste da Ucrânia.
Em artigo publicado na noite desta terça-feira no jornal The New York Times, Biden confirmou que decidiu “fornecer aos ucranianos sistemas de mísseis e munições mais avançados que permitirão que eles ataquem com mais precisão alvos-chave no campo de batalha na Ucrânia”. “Não estamos encorajando ou permitindo que a Ucrânia ataque além de suas fronteiras. Não queremos prolongar a guerra apenas para infligir dor à Rússia”, escreveu.
Na segunda-feira, ele já havia afirmado que os EUA não enviariam à Ucrânia “sistemas de mísseis que poderiam atingir a Rússia”. Contudo, se posicionados próximos o suficiente da fronteira, tais lançadores são capazes de alcançar o território do país vizinho.
Fontes do governo em Washington afirmaram que os ucranianos garantiram aos americanos que não vão atirar mísseis em território russo.
Embora não sejam sistemas de longo alcance, como os intercontinentais ou hipersônicos que a Rússia possui, os Himars representam um reforço significativo das capacidades ucranianas.
A Ucrânia havia pedido no começo de maio que os EUA enviassem dois tipos de lançadores de mísseis de alto alcance: o M142 Himars e o M270 MLRS.
Os Estados Unidos já entregaram canhões do tipo M777 howitzers, de 155 mm, que atingem alvos a 40 quilômetros de distância. Esse tipo de armamento é menor em relação aos dois solicitados pela Ucrânia, mas é bastante destrutivo, com margem de erro em relação ao ponto de impacto inferior a 4 metros.
Os próprios americanos, mobilizados no front oriental da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) desde o início da invasão russa, fizeram o treinamento dos militares ucranianos e organizaram uma operação sigilosa para transportar os M777 para dentro da Ucrânia.
Os lançadores fazem parte de um novo pacote americano de ajuda de segurança à Ucrânia no valor de US$ 700 milhões, que vai incluir ainda helicópteros, sistemas de armas antitanque do tipo Javelin, veículos táticos, peças de reposição, entre outros.
Mas por que a Ucrânia quer esse tipo de armamento?
Uma das explicações é o poder de fogo desses lançadores, que podem fazer com que os mísseis percorram uma distância de 32 a 500 quilômetros, dependendo do tipo de projétil utilizado.
Outro motivo é uma resposta da Ucrânia à chamada “nova fase da guerra”, na qual a Rússia concentra suas atenções na tomada do leste do país onde ficam as regiões separatistas de Luhansk e Donetsk.
Depois que as tropas russas fracassaram em tomar a capital ucraniana, Kiev, o Kremlin declarou que seu principal objetivo é a captura da região leste de Donbass. Se bem-sucedida, a ofensiva daria a Putin uma vitória que ele poderia apresentar ao povo russo em meio às baixas crescentes da guerra e às dificuldades econômicas causadas pelas sanções do Ocidente.
Lançadores podem ser levados em aviões
Os lançadores operam de maneira similar, erguendo parte da carroceria para lançar os mísseis —num movimento parecido com o de uma caçamba de caminhão quando vai descarregar areia, por exemplo.
Na verdade, o M142 Himars é mais parecido com um caminhão, enquanto o M270 é similar a um tanque de guerra.
Isso se deve ao tipo de rodas usados em cada um deles —no caso do M270 ficam envoltas em esteiras, enquanto no outro tipo não há ligação entre uma e outra.
Os dois veículos conseguem acomodar uma tripulação de três pessoas, não sendo necessário que saiam de dentro da cabine no momento dos disparos.
Para se deslocar de um ponto a ponto, o M270 é mais lento, podendo atingir velocidade máxima de 64,3 km/h, enquanto o M142 trafega a 85 km/h. Isso pode estar relacionado ao peso dos dois —24,95 toneladas e 10,9 toneladas, respectivamente.
Segundo a fabricante Lockheed Martin, os dois modelos podem ser transportados em aviões cargueiros, o que facilita o emprego desses veículos em combates.
Os dois lançadores têm capacidade diferente de munição. O M142 Himars pode transportar até seis foguetes ou um míssil capaz de atingir alvos a 300 quilômetros de distância. Já o M270 comporta 12 foguetes guiados, ou quatro mísseis de ataque de precisão (que percorre 500 quilômetros) ou dois Atacms (Army Tactical Missile System), segundo a fabricante.
Projetados nas décadas de 70 e 90
O M142 foi desenvolvido nos anos 90. De acordo com documentos oficiais divulgados em 2014, uma unidade chega a custar US$ 5,1 milhões, cerca de R$ 26,1 milhões.
O sistema foi utilizado pela primeira vez em combate em julho de 2007, na província de Al Anbar, no Iraque. Hoje, é utilizado em operações americanas no Afeganistão e na Síria, além dos Emirados Árabes Unidos, Jordânia, Singapura e Romênia.
Já o M270 foi desenvolvido no final dos anos 70 numa força-tarefa composta pelos Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha Ocidental, França e Itália. Com mais de 1.300 unidades espalhadas pelo mundo, estima-se que um M270 custe por volta de US$ 2,3 milhões (R$ 11,7 milhões).
Os primeiros M270 entraram em operação em 1982, após serem adquiridos pelo exército norte-americano. No entanto, eles só vieram a entrar em ação durante a Guerra do Golfo, em 1991. De lá para cá, ele participou de ações no Afeganistão e no Iraque.
O M270 foi produzido até 2003, mas segue sendo usado pelos exércitos de mais de 15 países, a maioria parte da Otan.