24.2 C
Ouro Branco

Equipe de transição de Lula busca destravar orçamento para reverter desmonte na Saúde

Anúncios

Pressão sobre os municípios e fim do Mais Médicos são obstáculos que a próxima gestão precisará enfrentar em 2023

A equipe de transição para o governo Lula corre contra o tempo para evitar que o orçamento para a Saúde em 2023 seja o menor desde 2014. É uma verdadeira bomba relógio armada com a ajuda do teto de gastos e de sucessivos cortes em programas essenciais que agora precisa ser neutralizada.

Para que isso aconteça, a equipe depende de um alívio considerável no orçamento deixado pela equipe econômica de Jair Bolsonaro para 2023, que pode ser alcançado com a PEC da Transição. Nesta quarta-feira (16), o time comandado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin apresentou a proposta aos presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP) e Rodrigo Pacheco (PSD).

É consenso entre gestores da Saúde e membros da equipe de transição ouvidos pelo Brasil de Fato que os R$ 149,9 bilhões, que seriam herdados do atual governo, são insuficientes para o ano que vem. Segundo eles, que se baseiam em dados de receita e despesas do próprio Ministério da Saúde, estão em risco medidas sanitárias urgentes e a oferta de atendimento básico à população. 

Ex-ministro da Saúde no segundo governo Dilma (2014-2015), o médico Arthur Chioro é um dos membros da equipe de transição da saúde, sob coordenação do senador Humberto Costa (PT-SP). Ele descreve o que a equipe identificou sobre o buraco deixado pelos sucessivos cortes na pasta.

“É até difícil identificar, porque eram R$ 10,47 bilhões que estavam sendo pulverizados em praticamente todas as políticas orçamentárias. Cito alguns programas que sofreram maior impacto: saúde indígena, R$ 900 milhões a menos; Farmácia Popular, R$ 1,5 bilhão; área de educação e formação em saúde R$1 bi; HIV-Aids, R$ 400 milhões; na atuação primária onde funcionava o Mais Médicos, R$ 1,5 bi”, elenca. 

Segundo os cálculos apresentados por Chioro, a esse montante foram somados os investimentos previstos e anunciados por Lula durante a campanha à eleição. Um valor total de R$ 27,7 bilhões, que viabilizaram ao Ministério da Saúde aumentar os repasses às Santas Casas, ao Programa de Imunização Nacional e à distribuição gratuita de medicamentos pela Farmácia Popular. 

“Antes que nos acusem de não repor recursos, nós utilizamos como referência exatamente a regra da emenda constitucional 86 que disciplina os municípios a aplicarem o mínimo de 15%, os estados 12% e a União 15% da receita corrente e líquida. Isso valeria caso a emenda do teto seja eventualmente revogada ou suspensa”, explica Chioro.

Corda estoura em cima das cidades

O subfinanciamento da saúde pública foi o tema do Congresso da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados), realizado entre 7 e 11 de novembro. Dentre os palestrantes, Adriano Massuda, professor da FGV-EAESP e que já foi secretário municipal de Saúde de Curitiba, os principais desafios de gestão passam pelo socorro às prefeituras.

“Os municípios são o ente federativo que tem uma menor capacidade fiscal e que mais aumentaram a fatia de despesas com saúde nos últimos anos. Então, é fundamental ter um aumento de recursos federais para compensar as grandes desigualdades em saúde que existem no país. Esses recursos, entretanto, precisam ser mais bem alocados, em áreas estratégicas como atenção primária”, opina.

Um déficit que recai sobre as prefeituras, que no passado receberam autonomia da União para solucionar os gargalos da Saúde, mas que agora se veem pressionadas para fechar as contas. 

“Desde a Emenda Constitucional 29, de 2000, houve uma descentralização da responsabilidade com os municípios que trouxe impacto significativo do comprometimento do orçamento municipal para a saúde. Só que isso foi sendo elevado e nós chegamos agora num patamar que inviabiliza as gestões das cidades. Você não pode pegar municípios de pequeno, médio e grande porte ou pequeno porte e comprometer 40% do seu recurso em saúde, porque vai faltar para todas as outras políticas públicas”, analisa Chioro.

O novo governo também terá que lidar com o fim do programa Mais Médicos. Gestores que atuaram no programa asseguram que a sua extinção levou à redução da cobertura do SUS nas cidades menores e mais remotas. E que seu substituto, o Médicos pelo Brasil, lançado em dezembro de 2021, não foi eficaz em atrair profissionais com a oferta de salários maiores. 

Mesmo se reativado, o Mais Médicos precisará ser adaptado para recalibrar a oferta de profissionais da Saúde em uma lógica que foi rompida nos últimos anos. É o que aponta Fabiano Ribeiro dos Santos, Subsecretário de Saúde do Espírito Santo e diretor do Instituto Capixaba de Ensino, Pesquisa e Inovação em Saúde – ICEPi.

“A falta de médico do Brasil não é uma responsabilidade do médico, é um problema histórico que está na base do sistema de saúde. Aí o Mais Médicos tinha essa compensação muito interessante. Não era só trazer profissionais de fora, era também abrir escolas médicas, mas com critérios, nos lugares mais vazios de formação. E também a premiação na prova de residência para o profissional que atuasse na atenção primária”, relembra.

Mutirão para retomar cobertura vacinal

O primeiro desafio do futuro governo será sanitário e também midiático. Até se fala no retorno do Zé Gotinha, personagem que andou sumido nos últimos anos e apareceu apenas timidamente quando Henrique Mandetta ainda era ministro da Saúde. 

Isso porque as campanhas massivas de vacinação devem voltar em todas as plataformas e mídias disponíveis. O objetivo é atrair o público em um cenário de queda de vacinação, além de suplantar o negacionismo e as notícias falsas propagados oficialmente pelo atual governo.

Além de uma possível nova onda da covid-19 com sub variantes da Ômicron, também merece atenção a poliomielite. A doença foi erradicada em 1994, mas recentemente se tornou motivo de alerta emitido pela Organização Pan-Americana de Saúde sobre o caso brasileiro. Para Fabiano dos Santos, o investimento em vacinação também precisa levar em conta a estrutura que será herdada.

“A participação dos municípios e dos profissionais da saúde foram fundamentais para evitar que a tragédia da covid fosse ainda maior, mas todos estão cansados. Se esgotaram todas as possibilidades de organizar a vacinação em horário diferenciado, tipo final de semana, porque você não consegue mais pagar hora extra e compensar folgas. Você tem dificuldade de contratar um técnico de enfermagem para preparar a sala de vacina e precisa de um profissional a mais para isso”, alerta o subsecretário.

Nesta quarta-feira, o presidente do Senado Rodrigo Pacheco (PSD) disse que colocará a PEC da Transição para ser votada já na última semana de novembro. Confiante no resultado, Chioro disse que o ministro da Saúde que será definido por Lula deve ter um perfil que saiba equilibrar conhecimento técnico e habilidade política.

“Caso essa renegociação que está sendo conduzida pelo Geraldo Alckmin seja bem-sucedida, inicia-se um processo de reorientação do financiamento, mas é um início. A gente tem que ter uma visão de longo prazo de fato para a gente chegar a um certo padrão de financiamento que seja suficiente, permanente e adequado para as necessidades da recomposição”, conclui. 

Mais artigos

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Últimos artigos