Um dos principais destinos turísticos do Rio Grande do Norte, Jenipabu é também uma área de proteção ambiental (APA), sendo uma unidade de conservação da natureza de uso sustentável. Localizada majoritariamente em Extremoz – somente 3% da área está na capital potiguar –, a APAJ é conhecida por suas dunas, mar, belo por do Sol e passeios radicais de buggy.
Quinta unidade de conservação (UC) criada no RN, por meio do Decreto nº 12.620, em 1995, a APAJ surgiu para equilibrar as atividades turísticas e a conservação do meio ambiente. Seu zoneamento ecológico econômico, criado em 2009, traz algumas normas e delimita os usos possíveis das diversas zonas da área de proteção, “visando à proteção dos recursos naturais, a recuperação de áreas degradadas e a promoção do desenvolvimento sustentável”.
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A criação da unidade foi motivada por conflitos entre o setor produtivo e o meio ambiente. Nesse contexto, conforme explica o ecólogo Eduardo Oliveira, gestor da APAJ, os donos de propriedades na região queriam cobrar pelo turismo ali desenvolvido.
“Nesse movimento, considerou-se os potenciais impactos a que o ambiente ia ser submetido. Se a atividade não fosse realizada de maneira sustentável, poderiam surgir vários impactos no campo dunar e na vegetação. A solução para esse conflito foi a conservação dos recursos ambientais”, pontua.
Em uma área de 1.881 hectares, apenas 52,6 deles em Natal, há cinco zonas, três subzonas e nove áreas distintas, com diferentes níveis de vulnerabilidade ambiental e diversos usos e formas de ocupação permitidos do território.
Belezas naturais devem ser visitadas com responsabilidade – Foto: Acom/Idema
Durante o conflito que culminou com a criação da UC, foi elaborado um termo de acordo extrajudicial que pretendia realizar “o levantamento da situação da área e o acompanhamento das atividades dos passeios de buggy”, diz Oliveira.
Turismo é uma das principais atividades da APAJ – Foto: Ascom/Idema
Contudo, o estudo não vingou, e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) teve que interditar a área para estudá-la, em 1994. “Com isso, a APA foi criada, (no ano seguinte,) promovendo o turismo e as demais atividades que ocorrem na área”, afirma o mestre em Ecologia e doutor em Etnobiologia e Conservação da Natureza.
Equilíbrio econômico e ambiental
Paradisíaca, a APAJ já foi cenário até de novelas da TV Globo, como “O Clone” (2001) e “Flor do Caribe” (2013), e atrai inúmeros visitantes todos os anos. Em Jenipabu, a exploração turística e a conservação do meio ambiente tendem a ser equilibradas.
Segundo Eduardo Oliveira, “é importante fazer esse equilíbrio através, principalmente, do respeito ao zoneamento ecológico da unidade”. “A gente tem que contar com a fiscalização, contar com a colaboração do conselho gestor e uma participação social efetiva na área, com denúncias, que nos ajudam a fiscalizar e a diminuir ao máximo os impactos na unidade”, pontua.
Os bugueiros, por exemplo, têm que ser credenciados junto ao Detran (Departamento Estadual de Trânsito) e ter treinamentos para conduzir os veículos sem prejudicar as dunas e a vegetação.
Algumas das principais formas de controle da área, além da fiscalização, são o plano de manejo da APAJ e o seu zoneamento ecológico econômico, ambos de 2009, mas, na avaliação de Oliveira, eles estão desatualizados e devem ser revistos no futuro.
Eduardo Oliveira, o gestor da APAJ, é ecólogo – Foto: arquivo pessoal
Na APA Jenipabu, é imprescindível “preservar os ecossistemas de praias mata atlântica e manguezal, lagoas, rios e demais recursos hídricos, dunas e espécies vegetais e animais”, destaca o Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do RN (Idema).
Biodiversidade
Assim como ocorre em diversas unidades de conservação estaduais, a APAJ é rica em biodiversidade, seja nas águas que a margeiam – indo do Rio Doce (Extremoz) até a Praia de Redinha Nova (Natal), seja nas muitas espécies de flora e fauna ali existentes.
Os levantamentos de flora e fauna da unidade datam de 2006, ou seja, têm quase duas décadas. Eduardo afirma que uma das metas da atual gestão é atualizar esses estudos, pois a expectativa é que aumente o número de espécies encontradas.
Exuberante, a mata atlântica é lar de diversas espécies – Foto: Mariana Gondim
No meio da mata atlântica, bioma da APAJ que comporta seus manguezais, lagoas, rios, restingas e outros ecossistemas, há pelo menos 235 espécies de flora.
Eduardo pontua que há ao menos seis espécies de orquídeas na APAJ, com destaque para a Cattleya granulosaa flor símbolo do RN.
“Ela é endêmica da região Nordeste, ou seja, só ocorre aqui, e ela consta na lista de espécies ameaçadas de extinção, na categoria vulnerável, conforme a portaria do Ministério do Meio Ambiente nº 148, de 2022, o que ocorre devido à sua retirada da natureza para comercialização”.
Ele diz que pessoas na Zona Norte de Natal já foram flagradas extraindo as orquídeas para vender nas feiras livres, o que é crime ambiental com três agravantes: “remover essa espécie da unidade de conservação, da zona de conservação; comercializá-la; e por se tratar de uma espécie ameaçada de extinção”, ele explica.
Já a fauna, desde os animais maiores até os pequenos e discretos, é outra das riquezas da APAJ. Somente de aves, por exemplo, o último levantamento enumerou 72 espécies. Ainda há répteis, anfíbios, peixes, mamíferos e invertebrados.
“Destaca-se, entre as espécies, o chorozinho-papo-preto, que é uma espécie endêmica da mata atlântica e consta na lista de espécies ameaçadas de extinção também”.
A APAJ é ainda usada para a soltura de animais silvestres, como jacaré-do-papo-amarelo, jiboia e aves: “Esses animais normalmente são oriundos de ações de fiscalização da Polícia Ambiental, do Ibama e do Idema. Às vezes, vêm por resgate, quando o bicho aparece no quintal de casa; ou por entrega voluntária. Então, nessas três situações, os animais vão para os postos do Ibama e são soltos lá na área”, diz Eduardo.
Questionado sobre a APAJ ser local de desova para tartarugas marinhas, ele diz que o local não é ponto regular de desova. De acordo com ele, se isso acontecer, é algo esporádico.
Dunas, vegetação e recursos hídricos também estão protegidos – Foto: Mariana Gondim
Outra característica da UC é ter um ecoposto, que possui três prédios. Na sede, a gestão desenvolve suas atividades e há uma sala de interpretação ambiental. Existem ainda a casa do pesquisador e o espaço onde fica o Batalhão de Policiamento Ambiental.
O ecoposto, em Extremoz, é aberto à visitação pública, e lá o conselho gestor realiza suas reuniões. Na sala de interpretação ambiental, há orquidário e espaço com exemplares de várias espécies da fauna e da flora da região.
Pesquisa científica e educação ambiental
A APAJ é também espaço de pesquisa científica e educação ambiental, pilares de unidades que visam à conservação da natureza. O gestor da unidade elencou pesquisas recentes, que estudam, por exemplo, a fauna e a biodiversidade da região. “Além dessa, temos uma pesquisa que visa identificar os padrões de ocupação e aves nos fragmentos do mata atlântica”.
“São estudos de extrema relevância, pois contribuem com a gestão e o manejo da unidade, propiciando o uso do conhecimento na análise dos problemas e na tomada de decisão”, frisa ele.
Unidade de conservação tem diversos usos possíveis, a depender da região – Foto: Mariana Gondim
Já em relação à educação ambiental, ele destaca o projeto Tamanduá-Mirim, que chega à sua 5ª edição em 2025, e projetos de limpeza da praia.
“O projeto Tamanduá-mirim desenvolve atividades socioambientais com adolescentes de 13 a 16 anos na perspectiva de motivá-los para serem futuros profissionais de turismo sustentável na APAJ”, Explicar.
“Os alunos são sensibilizados sobre a importância de preservar os nossos ecossistemas, contribuindo no trabalho de educação ambiental na comunidade, uma vez que eles passam a ser agentes multiplicadores e a usar as boas práticas ambientais”.
Revisar é meta do futuro
Para o futuro, Eduardo cita, entre os objetivos da gestão da APAJ, a realização de uma atualização do zoneamento ecológico econômico. Ele conta que alterações pontuais no documento estão sendo estudadas, para aumentar ou restringir os usos permitidos em determinados trechos.
Conforme já mencionado, o levantamento de fauna e flora também precisa de atualização. Além deles, o próprio plano de manejo tem mais de 15 anos.
Na parte de ecoturismo, Eduardo afirma que a APAJ tem um grande potencial e que a Trilha do Urubu é a mais famosa. “Estamos estudando a melhor estruturação dessas trilhas e, de repente, até criar novas trilhas. Vamos trabalhar nesse sentido de melhorar a estrutura das trilhas”, compartilha.
Conselho gestor e participação
Um dos principais usos permitidos na UC é o residencial, em áreas específicas, seguindo o gabarito do Plano Diretor de Extremoz.
A possível instalação de um estabelecimento hoteleiro, segundo Eduardo, precisaria ser aprovada pelos órgãos competentes, na parte de licenciamento, e, a depender do tamanho, por audiência pública e pelo conselho gestor. Esse conselho, aliás, exerce um papel importante para a efetividade da gestão da unidade, diz Oliveira.
“Através dos conselheiros, que são várias entidades, entre prefeituras, representantes da Câmara, Ibama, das universidades, da sociedade civil, ONGs, entre outros, esse grupo visa a contribuir para a gestão sustentável da unidade. É fundamental ter um conselho gestor atuante para cumprir o objetivo de resguardar os aspectos ambientais da APA”.