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Análise: efeitos da arapongagem da Abin no governo Bolsonaro

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Na ciência social, a academia mostra que a espionagem política gera impactos devastadores. Ao corroer as instituições democráticas, mina a confiança da opinião pública e serve para silenciar os opositores

Era, no mínimo, estarrecedor o que ocorria nos corredores da Agência Brasileira de Investigação (Abin) durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. A operação da Polícia Federal desencadeada ontem lançou luz sobre os meandros da atuação do grupo contra autoridades da República e desafetos políticos, como jornalistas, influenciadores digitais e formadores da opinião. Em primeiro lugar, está claro que não existia nada de estrutura paralela, pois, com o aval do comando do órgão, servidores utilizavam ilegalmente os sistemas para fazer arapongagem.

O segundo ponto que merece uma atenção especial é que, com base nas informações divulgadas até agora, se tratava também de uma grave ameaça à ordem democrática vigente. A coleta de informações confidenciais e de forma totalmente clandestina de partidos ou figuras políticas representa um ataque à liberdade e aos direitos humanos. É direito constitucional o sigilo de ligações, com exceção das situações específicas de investigação criminal ou instrução processual penal, com autorização judicial, para autoridade policial ou representante do Ministério Público, o que já sabemos que não era o caso.

Exemplos de arapongagem política existem aos montes na história política mundial. O mais famoso se trata do escândalo Watergate, em 1972, quando o presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon, ordenou a espionagem de seus oponentes políticos no Partido Democrata, levando ao impeachment. Em 2013, ao baixar milhares de documentos da Agência Nacional de Segurança (NSA, na sigla em inglês) e da CIA (a central de inteligência), Edward Snowden revelou como os EUA coletavam dados de milhões de pessoas em todo o mundo sem autorização judicial, desde cidadãos americanos até líderes políticos de países aliados. Houve um repúdio mundial.

No caso brasileiro, a investigação da PF sinaliza que a espionagem tinha ainda um caráter eleitoral. Transcrições de conversas mostram que havia um interesse em tirar a legitimidade do processo democrático e, com isso, influenciar o voto do eleitorado. À época, nunca é demais lembrar que estávamos no auge da polarização política, com uma disputa acirrada entre Bolsonaro e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Na ciência social, a academia mostra que a espionagem política gera impactos devastadores. Ao corroer as instituições democráticas, mina a confiança da opinião pública e serve para silenciar os opositores. A sensação de estar sendo vigiado tem um efeito inibidor na participação política e na liberdade de expressão. Cria-se, então, uma atmosfera de medo e intimidação que sufoca o debate público e impede o livre fluxo de ideias. Era esse o objetivo da “Abin paralela”? Com a palavra, o leitor.

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