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Câmara de Campina Grande (PB) aprova Lei que homenageia mandante da morte de Margarida Alves

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Zito Buarque, um dos mandantes do assassinato da líder sindical, será homenageado com nome de rua

Defensores dos Direitos Humanos e pela democratização da terra na Paraíba foram surpreendidos, no último dia 23 de agosto, com a notícia de que foi aprovada pela Câmara de Vereadores de Campina Grande uma homenagem a Zito Buarque, um dos mandantes do assassinato de Margarida Maria Alves. 

A Câmara Municipal de Campina Grande decidiu atacar a memória histórica de Margarida e, por 15 votos a favor e 1 contra – voto da vereadora Jô Oliveira (PCdoB) – resolveu homenagear José Buarque de Gusmão Neto, Zito Buarque, com o nome de uma das novas ruas da cidade.

A Lei nº 183 de 2022 tem autoria do vereador Waldeny Santana (União Brasil). O mesmo vereador bolsonarista já havia proposto o nome de Olavo de Carvalho para uma rua e uma praça de Campina Grande, em fevereiro deste ano.

Integrante do Grupo da Várzea, Zito Buarque foi acusado como um dos mandantes da morte da líder camponesa, assassinada no dia 12 de agosto de 1983 com um tiro no rosto, disparado por uma espingarda calibre 12.

O jornal Brasil de Fato Paraíba publicou em março de 2021 um dossiê com cinco capítulos, elencando o poderio político e econômico deste grupo até os dias atuais – veja os links no final desta matéria. Esse mesmo grupo também é acusado do assassinato de João Pedro Teixeira, e de vários outros mártires pela terra.

Falecido em fevereiro de 2019, de câncer, aos 70 anos, Zito circulava bastante no meio futebolístico, do qual era empresário e também já havia sido diretor de clube. A Justificativa para a sua homenagem segue por esse viés. Veja no texto da Lei.

Reprodução / Foto: Internet

Agosto – mês dos Direitos Humanos

“Porque entendo que é melhor morrer na luta do que morrer de fome”. As palavras são do discurso de Margarida Maria Alves, na comemoração do 1º de maio de 1983, em Sapé (PB). A líder sindical parecia antever que, poucos meses após este discurso, os latifundiários da região tentariam calar sua voz. 

Na época, Margarida ocupava o cargo de Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, na Paraíba, e denunciou a Usina Tanques, de propriedade de Zito Buarque, ao Ministério do Trabalho por abusos contra canavieiros e descumprimento da legislação trabalhista.

O mês de agosto tornou-se o mês dos Direitos Humanos justamente para lembrar a sua execução e para que não fosse esquecida a injustiça da sua morte, visto que nenhum dos mandantes pagou pelos seus crimes na Justiça.

Manifestações de repúdio

A lei aprovada pela Câmara recebeu repúdio de movimentos populares, entidades de defesa dos diretios humanos e personalidades políticas da Paraíba. Veja abaixo algumas manifestações: 

“A vida é um direito imprescindível e fundamental, e a vida de Margarida foi tirada e arrancada. Então essa lei é um extremo do abuso, em relação a própria Constituição Federal do Brasil. E nós paraibanos, que fazemos parte das Comissões da Verdade, dos Núcleos de Direitos Humanos, a Comissão da Memória, do Comitê paraibano Memória, Verdade e Justiça repudiamos esse ato porque é como se tivesse invertendo o papel da câmera, que é fiscalizar o governo para ver se a legislação está sendo cumprida e nesse caso, como é que uma câmera pode exaltar o crime?”

Professora Nazaré Zenaide do Comitê paraibano Memória, Verdade e Justiça.

“É lamentável a aprovação de uma rua com o nome de um assassino, principalmente porque o assassinato de qualquer vida humana, a vida humana de Margarida era uma vida imprescindível, que foi tirada. Ela foi uma das primeiras mulheres desse país que assumiu um sindicato dos trabalhadores rurais e que fez lutas imensuráveis na defesa dos canavieiros, das mulheres, dos filhos de canavieiras, e que foi para o enfrentamento com o poder judiciário. Então é uma rua que não pode ser nomeada com o nome do seu assassino. Não podemos admitir o nome de um assassino em uma rua. Nós vamos fazer de tudo para que isso não seja viabilizado, os movimentos sociais, as mulheres e quem preza pela vida e não a morte”

Dilei Schiochet, liderança do MST na Paraíba.

“Nós estamos passando por um momento político em que isso não me surpreende. Na verdade, essa leva de fascismo, de hipocrisia em torno do nome de Deus, da família e da pátria, está totalmente revestida de hipocrisia. Essa onda bolsonarista nasceu muito antes de Bolsonaro. Mas agora, nós temos um ambiente propício para que esse tipo de homenagem seja dada porque os latifundiários são prestigiados pelo governo, os índios estão morrendo, estão sendo assassinados; o armamentismo está crescendo e logicamente essas pessoas estão aparecendo, botando as unhas de fora porque são preconceituosos, homofóbicos, misóginos e, sobretudo, defendem a senzala. Líderes como Margarida Maria Alves marcaram uma época e deixaram um legado para nós.”

Marcos Henriques (PT), vereador de João Pessoa.

“Eu vi através das redes sociais esse fato de que a câmara de Campina Grande irá homenagear um mandante do assassinato de Margarida Alves e eu penso que a população de Campina Grande precisa analisar e dar uma resposta e reagir de maneira democrática, mas de maneira decisiva para pressionar essa Câmara porque fazer um absurdo desse. O legislador é para legislar a favor da população, da justiça, da democracia e não em favor desses criminosos que destroem a vida das pessoas, e também vidas de lideranças políticas para as famílias do campo viverem e trabalharem. E a população de Campina Grande tem que dar um basta a uma homenagem dessa natureza”.

Irmã Cleide, advogada e antiga dirigente da CPT.

“Nós da CPT ficamos perplexos quando foi divulgado o nome desse homem que, publicamente, nacional e internacionalmente, é conhecido como um dos responsáveis pela morte da mulher e líder sindical, defensora dos direitos da classe trabalhadora naquela época, e passar desses anos todos, após muitas denúncias, muita tentativa de levar esses responsáveis a serem penalizados, e infelizmente a justiça isentou eles da culpa. Mas para corolar, vem a câmara de Campina Grande com esse projeto e dá o nome dele a uma rua… é uma mancha na história da Paraíba como perseguidor, eliminador de quem defende a classe trabalhadora. E a classe política agora o homenageando, para ficar eternizado na história de Campina Grande”

Tania, da Comissão Pastoral da Terra da Paraíba.

“O MST repudia projeto de lei votado na câmara dos vereadores de Campina, que homenagea homem acusado de ser um dos mandantes do assassinato de Margarida Alves. 

O movimento também agradece e parabeniza a vereadora @jooliveirapb, única representante da casa a votar contra esse absurdo feitio que desrespeita a história de luta de um dos maiores nomes na luta pela terra e pelos direitos dos trabalhadores rurais.

Nesta terça-feira, 23 de agosto, foi votado, na Câmara Municipal de Campina Grande, o Projeto de Lei 183/2022, que nomeia uma das ruas de nossa cidade de “Zito Buarque” acusado de ser um dos mandantes do assassinato de Margarida Maria Alves. Margarida foi uma mulher paraibana, sindicalista, que muito contribuiu para a luta das trabalhadoras e trabalhadores rurais, e que foi assassinada na frente de sua casa.

Na época de seu assassinato, Margarida denunciou a Usina Tanques ao Ministério do Trabalho. De propriedade de Zito Buarque, a usina foi acusada de abusos contra canavieiros e de descumprimento da legislação trabalhista.

E embora Zito Buarque tenha sido absolvido, essa decisão nunca representou os movimentos sociais e as lutas por direitos humanos, que continuam ligando seu nome a exploração do trabalho e a toda a estrutura de opressão que esteve relacionada com a morte de Margarida; crime que, mesmo após 39 anos, continua impune.

Margarida Maria Alves, presente, sempre!’

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra da Paraíba (MST/PB)

“A Fundação de Defesa dos Direitos Humanos Margarida Maria Alves repudia o projeto de Lei nº 183 de 2022 de autoria do vereador Waldeny Santana e aprovado pela Câmara Municipal de Campina Grande, por 15 votos a favor e 1 contra – dado pela vereadora @jooliveirapb – na 73ª Sessão Ordinária da 2ª Sessão Legislativa da 18ª Legislatura, no último dia 23 de agosto de 2022, que denomina o nome de José Buarque de Gusmão Neto, Zito Buarque, a uma das novas ruas da cidade de Campina Grande.

Zito Buarque foi acusado como um dos mandantes da morte da líder camponesa Margarida Maria Alves, assassinada no dia 12 de agosto de 1983 com um tiro no rosto disparado de uma espingarda calibre 12. Na época, Margarida ocupava o cargo de Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, na Paraíba, e denunciou a Usina Tanques, de propriedade de Zito Buarque, ao Ministério do Trabalho por abusos contra canavieiros e o descumprimento da legislação trabalhista.

É lamentável poucos dias após lembrar-se a data do assassinato de Margarida, dia em que também é celebrado como Dia Estadual das Defensoras e Defensores dos Direitos Humanos, um órgão público homenagear exatamente aquele que foi apontado como um dos seus algozes. Tal ato é uma afronta ao legado de Margarida Alves e não existe justificativa esportiva que esteja acima do respeito aos direitos humanos e a memória das lutas sociais em nosso estado.

Esperamos que tal Lei seja revogada ou vetada pelas autoridades competentes no espírito de respeito pela história de luta dos direitos humanos na Paraíba.

João Pessoa, 24 de agosto de 2022

Alexandre Guedes
Presidente”

Fundação de Defesa dos Direitos Humanos Margarida Maria Alves

“A Central Única dos Trabalhadores da Paraíba, em nome de todos os seus sindicatos filiados, do campo e da cidade, vem a público manifestar a sua indignação pela aprovação do Projeto de Lei, por meio da maioria esmagadora dos parlamentares da Câmara Municipal de Campina Grande, que homenageia o latifundiário Zito Buarque dando o seu nome a uma das ruas da cidade. 

Figura essa que foi acusada de ser um dos principais responsáveis pelo assassinato da líder sindical  paraibana Margarida Maria Alves, por sua atuação na luta por direitos dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, mais especificamente, dos canavieiros do município de Alagoa Grande, crime que teve repercussão mundial e que permanece impune.

A CUT-PB lamenta esse projeto aprovado justamente no mês em que se completam 39 anos da morte de Margarida Alves, com um tiro de espingarda, que atingiu seu rosto, à porta de sua residência, na frente de seu filho ainda criança.

A CUT, ao mesmo tempo que repudia o desrespeito desses vereadores pela memória e história de luta dessa mulher, que deu sua vida pelo fim da violência no campo, da exploração dos camponeses e pela reforma agrária, aplaude Jô Oliveira, vereadora do PC do B, única representante na Casa Felix de Araújo, a votar contrariamente a esse insensato projeto”.

Central Única dos Trabalhadores da Paraíba (CUT-PB)

Dossiê da Várzea

O jornal da Brasil de fato publicou, em março de 2021, o primeiro de cinco textos de um dossiê sobre o grupo da Várzea. Os Herdeiros de Oligarquias e Fazedores de Fortunas, a Era de Interventores e de Consolidação de Impérios, a Democratização aos Conflitos Agrários, 1946-1958; as Ligas Camponesas e Golpe Civil-Militar (1959-1964) e os Velloso Borges após o golpe de 1964.

Sobre o grupo da Várzea, Dilei Schiochet comenta que o grupo mantém o poderio, que ao longo do tempo, foi se modificando, mas nunca deixou de oprimir.
 
“Na formação do MST nessa região, em 1989, quando viemos fazer a primeira ocupação na Paraíba, nós fomos barbaramente reprimidos pelo grupo da Várzea. Foi o primeiro enfrentamento para-militar do movimento no Brasil e aconteceu naquela região de Alagoa Grande. Nós tivemos pessoas que foram torturadas, e hoje é o assentamento Vitória. Mas esse grupo da Várzea, até os anos 90, agia fortemente armado, com seus capangas. Hoje, claro que as conjunturas vão mudando, mas o poderio econômico e político eles ainda têm o controle”.

MEMÓRIA HISTÓRICA | Dossiê Grupo da Várzea – Parte I: Herdeiros de Oligarquias e Fazedores de Fortunas

MEMÓRIA HISTÓRICA | Dossiê Grupo da Várzea Parte II – Era de Interventores e de Consolidação de Impérios

MEMÓRIA HISTÓRICA | Dossiê Grupo da Várzea Parte III: da Democratização aos Conflitos Agrários, 1946-1958

MEMÓRIA HISTÓRICA | Dossiê Grupo da Várzea Parte IV: Ligas Camponesas e Golpe Civil-Militar (1959-1964)

MEMÓRIA HISTÓRICA | Dossiê Grupo da Várzea Parte V: os Velloso Borges após o golpe de 1964

Fonte: BdF Paraíba

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