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Culpas e desculpas

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Não! Não vou pedir desculpas por nada. Não me sinto culpada do que você me acusa! Sou Travesti, e daí!? Minha travestilidade não é motivo de vergonha minha, nem alvo de julgamentos seus.

Não pedirei desculpas por amar demais e a quem quer que seja! A culpa é sua por amar de menos. Também não vou pedir desculpas pelos muitos sorrisos e dias ensolarados. Quem vê o mundo sombrio e as pessoas feias é você, afinal.

Não vou pedir desculpas pela minha nudez dentro e fora das redes sociais, nem pela transparência e espontaneidade de como me sinto e me expresso. Muito menos por flertar tanto e sempre. Culpa de quem não entende os sinais, de quem não se despe e termina por perder essa brincadeira de sedução deliciosa. Eu me lambuzo e me divirto!

Também não pedirei desculpas por compartilhar o que sinto, o que penso, o que vejo, o que acho… não quer saber, saia de perto! Não vou me anular, parar, me calar porque você acredita que eu preciso da sua validação, ou de freios.

Não vou deixar de me amar e de me achar uma gostosa. Desculpas por isso?! Nem morta!!! Vá amar seus padrões e tenha sempre as mesmas decepções.

Não vou pedir desculpas por tomar minha cerveja, minha cachaça, meu gim, minhas inúmeras taças de vinho, todos os drinks que quiser. Beba sua culpa! Não tenho ela no meu barzinho. Não curto ela nas minhas ressacas.

“Uns tomam éter, outros cocaína./ Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria./ Tenho todos os motivos menos um de ser triste.” Já disse Bandeira, imenso poeta pernambucano… Então, não!!! Não vou pedir desculpas e também não serei triste!

A culpa é você quem carrega! Pedir desculpas é para quem quer se desfazer delas. Eu fumo meu baseado, levanto taças e copos, brindo a mim, às conquistas, às decepções e às amizades, danço sozinha e de olhos fechados, algumas vezes agarradinha, com direito à cabeça coladinha e olhos fechados também. Sou dessas! Gosto de curtir a energia do momento.

Se sinto frio, quero abraços. E os peço, seja a quem for. Não me agasalho com culpas. Então eu não peço desculpas. Nem pelos abraços, agasalhos de alma, nem pelos beques, nem pelos brindes, nem pelos flertes, nem pelas risadas, nem pelas laricas, nem por dançar sozinha, muito menos por estar agarrada a alguém.

Não pedirei desculpas pelos meus chinelos de couro. (Meus pés agradecem). Nem pelas minhas roupas. Uso o que gosto. Folgada ou apertada, depende da minha vibe. Depende do meu humor, não do seu.

Não pedirei desculpas por todos os desenhos que cobrem meu corpo e me traduzem de tantas formas. Se culpe por ter tido vontades e ter sublimado tantas delas. Eu sou das realizações! Gosto de acontecimentos. Como “uma pedra no meio do caminho”. Né, Drummond!?

Eu vivo! Não sei até quando e, portanto, não me culpo e nem peço desculpas pelas minhas intensidades. “Respeito muito minhas lágrimas/ Mas ainda mais minha risada”. Isso na voz da Gal me traduz.

Por isso não só rio, mas gargalho. Não desejo, eu quero profundamente. Não só me apaixono, mas amo o quanto posso. A culpa aqui é sua que quer pouco, que ama menos ainda e que rir contido/a/e.

Não vou pedir desculpas por cantar desafinada quando a música está na minha cabeça e me embala o dia todo. Cantarei no chuveiro, na rua, na ida pro trabalho, nos corredores da escola. Culpe seus ouvidos incapazes de só ouvir o desafino e não reconhecer a alegria de ter uma música dentro de si.

Não vou pedir desculpas por cortar o cabelo curto, pintá-lo de fogo, delinear meus olhos de preto todos os dias. Nem pelos meus batons de vermelhos tão intensos quanto minha alma. Eu faço minha estética. Se culpe pelo seu control-C/control-V. Padronize-se e não me amole!

Eu sou ponto fora da curva. Ovelha desgarrada! Vértice oposto. E não vou pedir nem desculpas nem permissão para tanto. E que tanto! Sou imensa, explosiva, tsunâmica, deleuzeana. Seja também! Ocupar espaços, quebrar padrões, faz a diferença. Diz Manoel de Barros: “Quem anda nos trilhos é trem de ferro, sou água que corre entre pedras: liberdade caça jeito”

Então, não! Não vou pedir desculpas por nada disso. Nem por ser “macheira”. Testosterona me atrai e eu adoro a companhia masculina. Gosto de furar bolhas, inclusive a deles. Desconstrução é meu sobrenome. Ser desterritorializada é meu status quo.

Sei que você quer me culpar por muitas coisas, ou espera ouvir de mim um monte de desculpas. Mas, veja só, irei te decepcionar! Não me sinto culpada de nada e também não vejo motivo algum para pedir desculpas a quaisquer uns.

Hoje, enquanto respondia mensagens de amigos, alguém chegou por trás de mim e me abraçou. Me abraçou dizendo o quanto me amava. Me abraçou dizendo que tinha muito orgulho de mim. Me abraçou com beijos na cabeça e no cangote. Me abraçou com todo amor que uma pessoa pode dar a outra. Me abraçou dizendo que estava feliz demais porque ela estava prestes a ter uma filha doutora.

Falou isso orgulhosa, com seus olhinhos mais apertados que nunca e que já não veem tão bem, mas que veem para além do físico e palpável das coisas. Falou isso entre um sorriso ensolarado e uma sensação radiante de felicidade. Falou isso dizendo que era grata por saber que eu tinha boas amizades, que gostava de me ver acolhida e amada por esse monte “gente boa”.

Então, não! Só a ela eu devo desculpas. Só a ela eu devo meu “mea-culpa”, só a ela eu devo tudo.

A você, meu beijo (no coração ou na testa) e meu abraço! E o desejo de que todas as suas culpas e desculpas possam ser transformadas só em vida, só em viver plenamente. Sem medos, ou os enfrentando; sem preconceitos, ou os desconstruindo; sem barreiras, ou as ressignificando. Sem vigilâncias e proibições e amarras e preconceitos e esperas de validações alheias…

Vá ser feliz sem culpas nem desculpas, honey! Se baste e (re)nasça no ano novo que raia, ensolarado/a/e, como o sorriso orgulhoso, feliz, grato e pleno de minha mãe…

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