O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que a reivindicação de autonomia do Banco Central (BC) parte do “mercado” e defendeu a prerrogativa dos presidentes da República de indicar o chefe do BC. “Quem quer o Banco Central autônomo é o mercado”, disse em entrevista à Rádio Princesa, em Feira de Santana, na Bahia, nesta segunda-feira (1º).
As críticas à condução do BC por Roberto Campos Neto, o primeiro a ter autonomia no cargo estabelecida em lei, vêm sendo associadas por analistas à alta do dólar nos últimos dias ao serem interpretadas pelo mercado como indício de que Lula vai interferir nas decisões do BC assim que seu indicado assumir.
Na entrevista à Rádio Princesa nesta segunda-feira, também voltou a associar Campos Neto ao governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). “O Banco Central tem que ser de uma pessoa que seja indicada pelo presidente. Como é que pode um presidente da República ganhar as eleições e depois não poder indicar o presidente do Banco Central? Eu estou há dois anos com o presidente do Banco Central do Bolsonaro. Então, não é correto”, reclamou.
Lula acrescentou: “O que não dá é o cidadão ter um mandato e ser mais importante do que o presidente da República. É isso o que está equivocado”.
Na sequência, o presidente disse ter “paciência” para “esperar a hora” de indicar um novo presidente do Banco Central. Em 2024, Campos Neto encerra o seu mandato, o que abre a possibilidade de Lula indicar um substituto.
“Vamos ver se a gente consegue, com a maior autonomia possível e decência política das pessoas, ter um presidente do Banco Central que olhe o Brasil como ele é e não do jeito que o sistema financeiro fala”, afirmou.
Inflação
Lula voltou a dizer que teve um Banco Central “independente” com o comando de Henrique Meirelles nos anos 2000. O presidente também criticou novamente a manutenção da taxa de juros em 10,5%.
“O que você não pode é ter um Banco Central que não está combinando adequadamente com aquilo que é o desejo da nação. Nós não precisamos ter política de juro alto neste momento. A taxa Selic a 10,50% está exagerada”, afirmou.
O presidente da República também declarou que “a inflação está controlada” para argumentar que os juros deveriam estar mais baixos. “A inflação baixa para mim não é um desejo, é uma obsessão”, disse.
Projeções
Os economistas voltaram a aumentar as suas projeções de inflação deste ano e do próximo. A mediana do relatório Focus para o IPCA de 2024 passou de 3,98% para 4%, já 1 ponto porcentual acima do centro da meta, de 3%. Um mês atrás, era de 3,88%. A mediana para 2025, horizonte relevante da política monetária, subiu de 3,85% para 3,87%, contra 3,77% um mês antes.
Na semana passada, o governo publicou o decreto que regulamenta o novo sistema de meta contínua de inflação. A partir do ano que vem, o alvo será apurado com base no IPCA acumulado em 12 meses. Se ele ficar acima do teto ou abaixo do piso por seis meses consecutivos, vai se considerar que a meta foi perdida.
O Conselho Monetário Nacional (CMN) definiu que o centro da meta continuará em 3%, com tolerância de 1,5 ponto porcentual para mais ou para menos. O alvo e a banda poderão ser alterados pelo conselho, com base em uma proposta do ministro da Fazenda, com antecedência mínima de 36 meses para sua aplicação.
Nos horizontes mais longos, a mediana do Focus para o IPCA de 2026 continuou em 3,60% pela quarta semana consecutiva. A estimativa intermediária para 2027 ficou em 3,50% pela 52ª semana seguida.
O Banco Central espera que o IPCA fique em 4% em 2024, 3,4% em 2025 e 3,2% em 2026, considerando o cenário de referência, com a trajetória de juros extraída do Focus.
Juros
Em um cenário alternativo, com a taxa Selic constante ao longo do horizonte relevante, o BC espera inflação de 4% este ano e 3,1% no próximo.A mediana do relatório Focus para a taxa Selic no fim de 2024 continuou em 10,5% pela segunda semana consecutiva. Um mês atrás, a projeção era de 10,25%.
Na decisão mais recente, de junho, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central manteve a Selic em 10,5%, por unanimidade, e comunicou a “interrupção” do ciclo de cortes.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse em uma entrevista coletiva na semana passada que um aumento dos juros “não é o cenário-base” da autoridade monetária. Ao jornal Valor Econômico, ele afirmou que o nível atual da Selic é “suficientemente alto” para levar a inflação à meta.
A mediana do Focus para a Selic no fim de 2025 permaneceu em 9,5% pela segunda semana consecutiva, de 9,18% um mês atrás.