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Natal tem 1.491 pessoas morando nas ruas, apontam dados do Censo

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De acordo com assessoria da pasta, os números podem ser ainda maiores, ao final da tabulação de dados.

O número de pessoas em situação de rua em Natal chega a 1.491, de acordo com levantamento preliminar da Secretaria de Estado de Trabalho, Assistência Social e Habitação (Sethas). Os dados são parte do primeiro Censo da População em Situação de Rua no Rio Grande do Norte. Em todo o estado, cerca de 2.200 pessoas vivem nas ruas, sendo mais da metade na capital. O resultado final do censo deve ser divulgado em novembro deste ano. A previsão anterior era de julho.

O censo chega para complementar um outro estudo, divulgado no Boletim das Desigualdades, que mostra que a capital potiguar é uma das capitais que registrou maior índice de desigualdade de renda, no período de 2012 a 2021. Essa pesquisa foi desenvolvida em parceria do Observatório das Metrópoles, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e a Rede de Observatórios da Dívida Social na América Latina (RedODSAL). Além disso, o estudo também mostrou que cerca de 135 mil pessoas vivem em extrema pobreza no Estado, ou seja, vivem com renda per capita de aproximadamente R$ 160. 

Parte dessas pessoas encontrou moradia na Avenida do Contorno, próximo ao do Viaduto do Baldo. O local é conhecido por ser alvo de interferências da Prefeitura de Natal para despejo das pessoas que vivem ali. Por isso, a Defensoria Pública do Estado (DPE/RN) e o Ministério Público do Estado (MPRN) ingressaram na justiça com uma Ação Civil Pública (ACP) para suspender atos de remoção forçada em todo o município, em maio de 2022. Atos de remoção, desocupação e reintegração de posse coletivas deveriam permanecer suspensos até 30 de junho de 2022, mas o prazo foi prorrogado até 31 de outubro por decisão do Supremo Tribunal Federal.

De acordo com assessoria da DPE, o período ainda pode ser estendido. A ACP é uma ação impetrada, ou seja, tramita na justiça mas, ainda não há decisão judicial. Depois da ação, a defensoria não recebeu nenhuma notificação ou informação sobre despejos irregulares. “A instituição aguarda o julgamento da ação judicial. Enquanto isso, caso surja alguma notícia de violação de direitos, iremos averiguar”, explica a coordenadora do Núcleo de Defesa dos Grupos Sociais Vulneráveis e da População em Situação de Rua (NUDEV), Anna Paula Pinto. Ao todo a Ação aponta seis interferências apenas na região do viaduto entre 2020 e 2022. A ultima delas foi realizada no dia 11 de abril deste ano. 

A defensoria alegou, na época, que “Tais ações resultaram em episódios de graves violações de direitos humanos contra pessoas em situação de rua, com realização de remoções forçadas e violação”. Recebeu-se, ainda, alegações de que agentes municipais praticaram atos de agressão psicológica, moral e física. Além disso, entre 2020 e 2021, foram relatadas ações sem aviso prévio e com perda de documentos e “bens de uso pessoal das pessoas em situação de rua”. Através de assessoria, a DPE explica que o processo de despejo dessas pessoas precisa ser feito seguindo regras que garantam seus direitos. 

Por exemplo, é necessário informá-las sobre seu destino, seja em albergues ou centros de apoio, além de garantir a individualização de seus objetos pessoais, o que não era cumprido.  “Remover as pessoas levando para um albergue, informando para onde elas vão, individualizando todo o material, os pertences que elas tem, é um processo legal, mas isso não era o que era feito”, afirma a assessoria. A coordenadora explica, também, que a DPE não realiza nenhum trabalho permanente em conjunto com a Secretaria Municipal de Assistência Social (Semtas), que é responsável por ações de acolhimento das pessoas em situação de rua. 

Já a Semtas afirma, por meio de assessoria, que possui programas de acolhimento, mas que sua função é realizar um trabalho “educativo”, já que nem todas as pessoas querem sair das ruas. De acordo com a pasta, a secretaria não pode obrigar pessoas a saírem das ruas e se abrigarem nos albergues ou casas de apoio. Em nota, a secretaria explica que “A prefeitura municipal do Natal, por meio da secretaria municipal do Trabalho e Assistência Social (Semtas), oferta diversos serviços para a população em situação de rua, com capacidade para atendimento de 220 pessoas”. Dessa forma, entende-se que os centros tem capacidade para menos da metade das pessoas em situação de rua só em Natal.

A secretaria apresenta o Centro de Referência Especializado par População em Situação de Rua, conhecido como Centro Pop. O espaço tem a finalidade de assegurar atendimento e atividades direcionadas para o desenvolvimento de sociabilidades. Lá, é oferecido orientação jurídica, psicossocial e garantia de direitos, de segunda a sexta-feiras, a partir das 8h até as 17h. O centro também oferece café, almoço e lanche. Além deste, existe o Albergue Noturno, que oferece serviços de pernoite, alimentação e abrigamento.

Existe, ainda, a Unidade de Acolhimento para Adultos e Famílias em Situação de Rua, disponível 24h. Este oferece uma  equipe multidisciplinar composta por assistente social, psicólogos, educadores sociais, orientadores sociais e cuidadores. Além disso, a Semtas divulga que o município tem cerca de 121 famílias inseridas no benefício de aluguel social, concedido a partir da regulamentação da Lei nº 7.205, dos Benefícios Eventuais da Assistência Social. 

Embora os centros ofereçam uma certa variedade de serviços, não é possível abranger todas as pessoas. De acordo com Anna Paula Pinto, a defensoria se mantém em contato com a Unidade de Acolhimento 24h e o Albergue Noturno, unidades de assistência social gerenciadas pela Semtas, para saber sobre eventual disponibilidade de vagas; porém, há uma fila de espera significativa.  Além disso, a pasta afirma que ainda não tem acesso ao levantamento feito pela Sethas e que é necessário aguardar a divulgação para pensar em ações que abranja toda essa população. 

Moradores de rua contam as suas histórias

Essa situação é repercutida por Francisco Charliton, que vive nas proximidades do Viaduto do Baldo há cerca de 20 anos. Ele conta que já se encontra em situação de rua há 30 anos, mas afirma que tem muitas profissões. É pintor, pedreiro, eletricista. Hoje trabalha com reciclagem e quer dar uma vida melhor para sua esposa, que está grávida. Apesar do desejo, ele afirma que ainda é usuário de drogas, mas reconhece que precisa de ajuda. Ele conta que os despejos são uma forma de destruir seu lar, mesmo que este seja à beira da Estação de Tratamento de Esgoto do Baldo. 

Além dele, Nivaldo da Silva, 60, já vive nas redondezas há mais de 15 anos e nunca possuiu casa em Natal. Ele conta que veio da Paraíba e chegou em Natal em dezembro, mas não lembra o ano. Entre um ônibus e outro ou de carona, ele diz que se mudou porque não tinha um bom relacionamento com a família. “Não me dou com a família”, afirma. Ele relata que, vez ou outra, a prefeitura quer tira-los de lá. “Chega aqui e quer espancar o povo”, disse. Ele se junta a Charliton na reclamação de que não há lugar para eles ficarem, que o albergue disponibilizado já está lotado. 

Além deles, Marli Rayane de Souza, 26, diz que já perdeu seus documentos e os do marido em uma das ações de despejo. Ela conta que precisou escondê-los dentro de um sapato, mas não foi suficiente. Ela mora há três anos na região, mas antes morava o bairro das Rocas. É casada, mas diz que o marido tem dificuldade para trabalhar, já que passou por cerca de cinco cirurgias em um dos pés. Conta que vive na rua desde os 12 anos e hoje faz bicos como empregada em algumas casas. Além disso, também cata material para reciclagem na rua. 

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