A relação do governo Lula com os militares, neste primeiro ano de mandato, foi marcada pela conciliação e uma estabilidade frágil. Esta é a percepção de Rodrigo Lentz, cientista político autor do livro A República da Segurança Nacional. Ele participou ao vivo do Central do Brasil nesta sexta-feira (22).
Na avaliação do pesquisador, o presidente Lula adotou uma postura de conciliação, sem apostar em grandes rupturas, para poder preservar o início do mandato. Mas este clima sem grandes tensões com os militares é uma falsa aparência, na avaliação de Rodrigo, não traz a devida segurança para o regime democrático.
“É uma corda bamba prestes a arrebentar”, alerta o pesquisador.
“O bônus concreto dessa conciliação foi a obediência do comando das forças, sobretudo do exército. As forças armadas não foram foco de desestabilização do governo. Agora tem um ônus. Essa estabilidade é frágil e ela mantém uma série de poderes e posições de poder dos militares que, se a conjuntura e o vento mudarem, as coisas podem se transformar contra o governo”, alertou.
Um indicativo desse caráter conciliador do governo com os militares foi a escolha de José Múcio para o cargo de ministro da Defesa. Lentz avalia que ele foi escolhido para representar os interesses dos militares dentro do governo. Mas, ao mesmo tempo, o pesquisador reconhece que Múcio era o perfil possível naquele momento, diante do contexto instável da transição.
“O governo teve que lidar e enfrentar uma circunstância de insubordinação dos comandantes das forças, inclusive com a emissão de uma nota conjunta, em que os comandantes apoiavam os acampados em frente aos quartéis que pediam o golpe de Estado, criticavam o judiciário e não reconheciam o resultado da eleição”, relembra Rodrigo.
“A escolha do Múcio foi nesse sentido, em um momento de insubordinação. A escolha que o Lula se colocou, de conciliação, um dos atos nesse sentido foi a escolha de um político conservador, de uma direita tradicional e de uma dissidência da antiga Arena”
Na entrevista, Rodrigo também tratou sobre os desafios enfrentados para avançar na reparação às vítimas da Ditadura Militar e como este contexto de conciliação com os militares pode dificultar a velocidade das ações necessárias.
“Eu acho que os movimentos populares, a sociedade civil, os partidos também devem entender que não é um tema da só das vítimas, não é um tema só de familiares e sobreviventes. É um tema da sociedade democrática e é uma pauta de defesa da democracia”, apontou, destacando que a sociedade precisa superar “a cultura da impunidade”.