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Seminário sobre o golpe de 64 debate anistia e educação militar

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A revisão da Lei da Anistia, a abertura dos arquivos da ditadura e mudanças na educação militar foram algumas das propostas defendidas no seminário “Ditadura nunca mais, democracia sempre”, realizado nesta sexta-feira (31) pela seccional fluminense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ). O evento, que também foi transmitido pela internet, foi organizado para lembrar os 59 anos do golpe militar. Estiveram presentes advogados, sociólogos, historiadores, militantes e familiares de mortos e desaparecidos durante o regime militar.

Para o advogado Sérgio Sant’Anna, integrante da Comissão de Justiça de Transição e Memória da OAB-RJ, a Lei da Anistia desconsidera direitos fundamentais e é incompatível com a Constituição de 1988. Aprovada em 1979, ainda durante o regime militar, ela permitiu que militantes exilados voltassem ao país, mas também assegurou que torturadores não fossem processados criminalmente.

Em decisão tomada em abril de 2010, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu por 7 votos a 2 a constitucionalidade da Lei da Anistia. A discussão ocorreu dentro de um processo movido pela OAB, que pleiteava a anulação do perdão dado aos representantes do Estado, tais como policiais e militares, acusados de praticar atos de tortura. “Existe dentro da OAB vários segmentos que entendem que deveria ser reprovocada a discussão sobre a Lei da Anistia, até por conta da jurisprudência do direito internacional”, disse Sant’anna.

Em novembro de 2010, sete meses após a decisão do STF, a Corte Interamericana de Direitos Humanos considerou a Lei de Anistia ilegal por conter dispositivos que impediam a investigação e a punição de graves violações de direitos humanos durante o regime militar. O Brasil foi condenado por ignorar obrigações decorrentes do Direito Internacional. Em 2018, a Corte Interamericana de Direitos Humanos anunciou uma nova condenação, dessa vez pela falta de investigação e julgamento dos responsáveis pela prisão, tortura e morte do jornalista Vladimir Herzog, ocorrida em 1975.

Essas decisões, inclusive, já repercutiram em sentenças de tribunais brasileiros. No ano passado, por exemplo, a 8ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro julgou que a Lei de Anistia viola a Convenção Americana de Direitos Humanos e negou o arquivamento de três procedimentos investigatórios sobre crimes supostamente cometidos por agentes públicos durante a ditadura militar. A decisão apontou que são imprescritíveis os crimes que representem graves violações a direitos humanos.

Para Sérgio Sant’Anna, a falta de punição dos agentes envolvidos no regime instaurado após o golpe de 1964 tem relação com os atos antidemocráticos ocorridos no início do ano. “O 8 de janeiro demonstra que nós temos que voltar a esse debate”, avaliou o advogado. Na ocasião, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, insatisfeitos com o fracasso de sua tentativa de reeleição e sua derrota eleitoral para o presidente Luís Inácio Lula da Silva, invadiram e depredaram os edifícios da Praça dos Três Poderes, em Brasília. Muitos pediam por uma intervenção militar e defendiam abertamente um golpe de estado.

Victória Grabois, integrante do Grupo Tortura Nunca Mais-RJ, também defendeu a revisão da Lei da Anistia e cobrou ainda o cumprimento de decisões judiciais que determinam a abertura dos arquivos da ditadura. Ela perdeu o pai, o irmão e o marido durante o regime militar e afirma que há muito tempo não via uma mobilização tão grande dos familiares dos mortos e desaparecidos, que estiveram em Brasília para uma audiência com o ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, Silvio Almeida. Ela, no entanto, criticou a limitação do número de pessoas que puderam se pronunciar.

Segundo Victória Grabois, mais importante do que a reparação econômica, são os esclarecimentos e a preservação da memória, para que não se repita. “Onde, como e quando mataram nossos familiares? É isso que nós queremos saber”, disse. Apesar de decisões judiciais determinarem a liberação de arquivos da ditadura, historiadores e pesquisadores acreditam que ainda existem diversos materiais mantidos em segredo.

Trechos de um áudio de uma sessão secreta do Superior Tribunal Militar (STM) ocorrida em 1977, que vinha sendo mantido em sigilo, foi divulgado de forma inédita pela Agência Brasil. Nele, o general e ministro Rodrigo Octávio admite ter testemunhado um caso de violência em uma unidade do Exército. A gravação integra um material obtido pelo advogado e pesquisador Fernando Fernandes e reunido no acervo do site Voz Humana, lançado hoje (31).

Educação militar

O historiador e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Francisco Carlos Teixeira da Silva, apresentou um painel onde avaliou que a educação militar permite a reprodução da ideologia da tutela militar sobre a sociedade brasileira. Ele afirmou que os conteúdos ministrados distorcem os fatos históricos e defendeu que sejam realizadas mudanças por meio de portaria ministerial.

Para Francisco, narrativas de exaltação do regime militar no interior das Forças Armadas fornecem uma base ideológica para atos que trazem instabilidade para a democracia. Ele também cobrou ampliação das investigações sobre os eventos antidemocráticos de 8 de janeiro. “Acusar os 20 mil que foram para Brasília, acusar a omissão do governo do Distrito Federal e ignorar o que estava acontecendo dentro das Forças Armadas naquele momento é muito complicado”, disse.

O historiador considerou também ser ilegal a existência de monitoramento de movimentos sociais pelo serviço de informações do Exército brasileiro, o qual deveria estar voltado para mapear ameaças internacionais e manter vigilância de fronteiras. “Não cabe às Forças Armadas vigiar a cidadania”.

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